15 de setembro de 2008

Eu tenho um cachorro que não é meu

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Eu estava cheio de idéias fluindo em minha cabeça, só que não conseguia iniciar uma história.

- Cuidado, isso me parece plágio, hein?

- Isso não é plágio, é clichê...

Neste instante as idéias se esvaíram.

- Que desgraça!

Bom, eu me lembro de ter dito que ela era “uma flor com uma pétala arrancada”. Eu não falei o significado deste poeminha que acabara de criar para ela. Sou péssimo em poemas, sou péssimo em narrativas também. Meu amigo Antonio César sim, ele escreve algumas coisas legais, não é tão bom quanto García Marquez ou Dostoiévski, claro, mas diverte e até nos faz pensar um pouquinho. Bom, como eu ia dizendo, mesmo não tendo falado o que significava ela entendeu. Entendeu 10%, mas entendeu. Ela é muito inteligente, quase tanto quanto eu.

Ande de moto sem capacete pelo menos uma vez na vida, dizia minha amiga, minha melhor amiga, a Anna Carla Ferraz. Ela repetia isto a todos os seus melhores amigos e estes à algumas pessoas especiais.

Rodrigo e Antonio César fizeram alguma coisa errada. O que será que eles fizeram? Trouxeram cadeira para que se sentassem, porém permaneceram em pé.

Ah! Já ia me esquecendo, o nome da menina do poeminha é Maria Camilla. Quando ouvi a história sobre ela tirando foto em frente ao Banco da Camila, achei hilário. Como eu gostaria de conhecê-la.

- Tenho de cortar as unhas, estão me incomodando a escrever.

A Maria Camilla parece ser uma pessoa perfeita, adoraria conhecê-la, acho que já disse isso, não importa. Adoraria contar a ela sobre minhas viagens, sobre as reuniões filosóficas que eu e meus melhores amigos; a insuperável analítica Anna Carla, seu irmão, César Ferraz, profundo conhecedor de técnicas de assassinos seriais e a pessoa mais inteligente que conheci, Antonio César. Nem a conheço, mas sinto uma necessidade colossal e irresistível de amá-la e protegê-la. É como se eu sentisse que Maria Camilla fosse minha alma-gêmea, só que almas-gêmeas não existem. Isto é triste.

- O que vocês estão fazendo aqui? Sentem se, isso me incomoda.

Os dois se sentaram, tocava Enya na sala ao lado. Acho que a “coisa errada” que fizeram foi ter libertado a bola verde, aquela que no próximo eclipse iria repetir o ato do primeiro momento do início do Universo.

“É muito perigoso comparar crianças com anjos”. Será? Isto é relativo. Depende muito da criança. Depende muito da pessoa. O Renan, por exemplo, eu o compararia mais com o Demônio, já a Raissinha, ela sim, é um anjo, uma estrelinha. Depende da pessoa, depende da criança.

Nunca achei que terminaria assim, na verdade nunca achei que terminaria. A última coisa que pensei, sabe? na hora da morte, quando percebemos que a vida está se esvaindo da gente? então: é mentira quando dizem que toda a nossa vida passa pela nossa cabeça em um segundo. Pelo menos comigo não foi assim, não foi toda a minha vida que pensei, não dá tempo, na verdade pensei em todas as coisas que ainda não tinha feito: coisas que deixei “para depois”. Uma dessas coisas é que deveria conhecer alguém que meu amigo Antonio César conheceu em sua viagem a uma bienal no Rio de Janeiro.

- “Sinto uma necessidade irresistível de amá-la e protegê-la”.

- Durante toda a vida, a morte fugira de mim.

- Você não existe por completo, sempre faltará algo, talvez seja por isso.

A última coisa que fiz na vida foi morrer. Mas eu queria tanto escrever o final desta história, escrever depois de ter conhecido a Maria Camilla. Ela é um anjo, Antonio César me disse ter conseguido ver suas asas e sua auréola.

- Pode liberar os dois, eu mesmo vou terminar o que começaram! Essa raça de solitários e egoístas, destruidores da Natureza, adoradores da ilusão não merece existir por nem um dia a mais aqui Neste planeta abandonado nos recantos do Universo.

Antonio César deu um sorriso de felicidade. Rodrigo olhava sério como se estivesse indiferente. Outra música de Enya iniciava na sala ao lado.

Em nossas reuniões de filosofia, discutimos uma vez sobre o que Hegel dizia; dizia que tudo é uma realidade criada por nós mesmos, dizia que tudo é imaginação. Mas não é bem assim, o mundo está bem aqui na nossa frente. Apenas nos recusamos a aceitá-lo como realmente é. Isto é triste.

“- Ela é uma flor com uma pétala arrancada”.

Por que não me tornei um rebelde que depois de espalhar que tinha visões do futuro, as mãos seriam cortadas e os olhos furados e jogado nas ruas para que servisse de exemplo aos demais? Por quê?

Acordei e vi meu barco à deriva outra vez.

Os tripulantes desapareceram.

Os passageiros, idem.

Foi assim que vi minha morte. Não estou triste, meus olhos lacrimejam por causa da poeira. Morrerei de “fome” antes de o meu barco chegar à terra firme. Sem me despedir de meus amigos, e nem ver Maria Camilla.


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11 de setembro de 2008

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A Eternidade é retrógrada?
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